Abraham
Lincoln
A estrada foi ficando para trás e a medida que
caminhava outra imagem ia tomando forma a minha frente. Mas desta vez não era
uma figura animada de mim ou criatura encapuzada, era uma casa, na verdade um
casarão feito com pedras claras e telhado de cerâmica escura.
-Eu quero!
Repeti as palavras escritas na porta da mansão
silenciosa.
Ao mesmo tempo em que parecia sombria e
misteriosa, ela parecia atrativa e convidativa. A estrada terminava exatamente
em sua porta, o que significava que teria que entrar se quisesse continuar o caminho.
Em uma altura daquela onde eu já havia batido boca comigo mesmo e caminhado em
uma trilha de tijolos criado do nada, entrar em uma mansão no meio do caminho
não representaria nada demais. E foi o que eu fiz, a porta estava destrancada e
o único esforço que eu precisei fazer foi girar a maçaneta e caminhar pelo hall
até descobrir uma pessoa debruçada sobre a janela da sala. Uma mulher
-Olá, seja
bem vindo a primeira casa, é um prazer te receber. A saída fica logo ali no fim
do corredor a esquerda, pode seguir o seu caminho e tenha uma boa viagem!
-Pera aí, o que? -Não pude deixar de ficar perplexo
-E isso tudo aqui foi pra quê?
-Eu não tenho nada para acusar você, então pra
que todo esse rodeio? Apenas. -Ela coreografou apontar para a saída com os
braços -Vá, e não olhe mais para trás.
-Eu sei que tudo isso é muito bizarro e que as
coisas estão cada vez mais estranhas, mas porque eu deveria ser acusado?
-Eu não
sei. -Ela se sentou na penteadeira e começou a pentear os cabelos, mas o
estranho era que não havia reflexo no espelho. -Pergunte a si mesmo!
Aquela mulher de cabelos longos e negros parecia
familiar, e assim como a sua feição, as palavras vindas dela pareciam falsas. E
naquele mesmo instante em que pensei isso me veio as palavras pela boca, eu
não queria mais pensar em nada era a hora apenas de agir.
-Você está mentindo!
-(Risos) E quem é você pra me julgar? Você é tão
mentiroso quanto eu, e o pior, faz isso com uma polidez e sutileza que me deixa
impressionada. -Ela levantou e caminhou até a porta cruzando os braços. -Não
vai querer entrar nesse assunto agora, vai?
-E claro que eu vou... Eu preciso saber a
verdade.
-E de qual verdade você fala, existe alguma
verdade absoluta?
-Ta bom, eu vou entrar no seu jogo!
-E quem disse que eu estou jogando?
Tudo o que
eu falava a garota convertia em dúvida, parecia muito fácil, e isso me trouxe
recordações terríveis da idade das trevas quando o outro eu cruel reinava. Era
sempre daquele modo, a mentira começava e não tinha limites até se tornar a
minha verdade, cada vez mais eu me tornava um personagem e construía enormes
cenários e instalações baseadas em inverdades, e aquilo que eu estava vendo
parecia uma encenação do que vivia. Então eu sabia que não havia modo de
encontrar a verdade em uma pessoa que só sabia mentir, a menos que ela parasse
de acreditar na própria mentira. Foi aí que decidi falar.
-Sabe, você nunca vai ter razão... -A mulher
jogou os longos cabelos negros para trás e desdenhou, mas mesmo assim
continuei. -Por que uma hora a vida cobra tudo o que plantamos. E você está
presa a nada, quer me deixar passar porque pra você é mais fácil mentir que
enfrentar os próprios erros. Mas olhe em sua volta! -Eu abri os braços e girei
sobre a sala. -Acha que isso aqui é real? Isso é fruto de enganação, está
sozinha aqui porque ninguém acredita que isso é real.
-Mas eu sou real, você não pode me ver?
-Poder eu posso! Mas e você, Consegue se ver?
A mulher arregalou os olhos e seu rosto pareceu
mais agressivo.
-Isso é
fruto da sua cabeça. -Insistiu a mulher. - Você é quem quis assim...
-Não, eu nunca quis isso aqui, eu nem sei o que
me espera a frente! Isso aqui é sobre você!
-(GARGALHADA) Desde que mudou não está mentindo
muito bem...
-Eu aprendi, e pelo visto você precisa também. Não
se vê no espelho porque isso tudo que criou não existe, essa vida, esse jeito,
você mentiu tanto, que as pessoas começaram a ver você de diversas formas
possíveis, menos a que realmente é. Está sozinha porque todos desistiram das
suas mentiras. E no fim, é isso que sempre sobra quando não agimos com verdade!
-É MENTIRA! VOCÊ ESTÁ MENTINDO! É O MAIOR
MENTIROSO QUE EU JÁ CONHECI... COMO PODE FALAR SOBRE ISSO!
-Todo mundo mente, e isso não tira a culpa de ninguém.
Mas diferente de você eu não vivo em mentira. Eu evoluí!
-Não... Não... Não... As paredes, os móveis e
toda a casa começou a derreter revelando um lugar completamente abandonado,
sujo e cheio de poeira.
-Caralho, você era boa na mentira, hein...?
Os empregados começaram a aparecer como se
estivessem perdidos em um outro mundo, e da mesma maneira que olhavam a casa
que estava entregue as moscas eles olhavam para a patroa que estava jogada ao
chão chorando.
-Reconstruir pode ser difícil, mas viver sem ter
peso é muito mais fácil e melhor... Eu nunca tive medo de construir, eu paguei
o preço e refiz. -Eu sorri para o auto e sussurrei baixinho. -Obrigado tio, eu
entendi a lição.
Ela se levantou e enxugou as lagrimas.
-Os preços são altos, garoto! Acha que as coisas
mudam de um dia para o outro?
-Claro que não, mas. -Eu abri os braços novamente
na sala. -Reconhecer já é um começo, não é?
-E o que eu devo fazer agora?
Ela fez
cara de nojo
-Bem, arrumar a bagunça!
Ela estalou os dedos para os empregados.
-Vocês! Arrumem essa casa, deixem ela...
Apresentável de novo!
Eu sorri para ela como forma de incentivo e em
troca ela balançou a cabeça.
-Venha, quero te dar uma coisa.
Ela abriu o porta joias empoeirado da penteadeira
e tirou um pulseira com um pingente.
-Isso é pra você, você mereceu garoto, leve-a e
complete todos os espaços até chegar ao fim da trilha.
-Nossa, é lindo!
Eu estendi o braço e ela o prendeu no meu pulso.
-Agora vá, e como falei não olhe para trás, você
já superou esse nível.
Eu corri para os fundos da casa e saltei para a
trilha, eu me sentia feliz e mais leve, o pingente balançava a cada novo passo
que eu dava, e a sensação de dever cumprido me preencheu de tal forma que o
caminho pareceu mais curto quando cheguei em uma outra mansão, mais rústica com
horta e pomar. Era incrível, como as coisas podiam estar tão próximas e parecer
tão diferentes. Eu estava entrando em uma fazenda.
Genteeeee, qual é a lição?? Tô me batendo um pouco!
ResponderExcluirSorte! =*