domingo, 17 de julho de 2016

Minha história eu mesmo faço! Ep. 1 A primeira casa, tão bela quando as presas de Áries.



"Pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo."
Abraham Lincoln


A estrada foi ficando para trás e a medida que caminhava outra imagem ia tomando forma a minha frente. Mas desta vez não era uma figura animada de mim ou criatura encapuzada, era uma casa, na verdade um casarão feito com pedras claras e telhado de cerâmica escura.

-Eu quero!

Repeti as palavras escritas na porta da mansão silenciosa.

Ao mesmo tempo em que parecia sombria e misteriosa, ela parecia atrativa e convidativa. A estrada terminava exatamente em sua porta, o que significava que teria que entrar se quisesse continuar o caminho. Em uma altura daquela onde eu já havia batido boca comigo mesmo e caminhado em uma trilha de tijolos criado do nada, entrar em uma mansão no meio do caminho não representaria nada demais. E foi o que eu fiz, a porta estava destrancada e o único esforço que eu precisei fazer foi girar a maçaneta e caminhar pelo hall até descobrir uma pessoa debruçada sobre a janela da sala. Uma mulher

 -Olá, seja bem vindo a primeira casa, é um prazer te receber. A saída fica logo ali no fim do corredor a esquerda, pode seguir o seu caminho e tenha uma boa viagem!
-Pera aí, o que? -Não pude deixar de ficar perplexo -E isso tudo aqui foi pra quê?
-Eu não tenho nada para acusar você, então pra que todo esse rodeio? Apenas. -Ela coreografou apontar para a saída com os braços -Vá, e não olhe mais para trás.
-Eu sei que tudo isso é muito bizarro e que as coisas estão cada vez mais estranhas, mas porque eu deveria ser acusado?
 -Eu não sei. -Ela se sentou na penteadeira e começou a pentear os cabelos, mas o estranho era que não havia reflexo no espelho. -Pergunte a si mesmo!
Aquela mulher de cabelos longos e negros parecia familiar, e assim como a sua feição, as palavras vindas dela pareciam falsas. E naquele mesmo instante em que pensei isso me veio as palavras pela boca, eu não queria mais pensar em nada era a hora apenas de agir.

-Você está mentindo!
-(Risos) E quem é você pra me julgar? Você é tão mentiroso quanto eu, e o pior, faz isso com uma polidez e sutileza que me deixa impressionada. -Ela levantou e caminhou até a porta cruzando os braços. -Não vai querer entrar nesse assunto agora, vai?
-E claro que eu vou... Eu preciso saber a verdade.
-E de qual verdade você fala, existe alguma verdade absoluta?
-Ta bom, eu vou entrar no seu jogo!
-E quem disse que eu estou jogando?

Tudo o que eu falava a garota convertia em dúvida, parecia muito fácil, e isso me trouxe recordações terríveis da idade das trevas quando o outro eu cruel reinava. Era sempre daquele modo, a mentira começava e não tinha limites até se tornar a minha verdade, cada vez mais eu me tornava um personagem e construía enormes cenários e instalações baseadas em inverdades, e aquilo que eu estava vendo parecia uma encenação do que vivia. Então eu sabia que não havia modo de encontrar a verdade em uma pessoa que só sabia mentir, a menos que ela parasse de acreditar na própria mentira. Foi aí que decidi falar.

-Sabe, você nunca vai ter razão... -A mulher jogou os longos cabelos negros para trás e desdenhou, mas mesmo assim continuei. -Por que uma hora a vida cobra tudo o que plantamos. E você está presa a nada, quer me deixar passar porque pra você é mais fácil mentir que enfrentar os próprios erros. Mas olhe em sua volta! -Eu abri os braços e girei sobre a sala. -Acha que isso aqui é real? Isso é fruto de enganação, está sozinha aqui porque ninguém acredita que isso é real.
-Mas eu sou real, você não pode me ver?
-Poder eu posso! Mas e você, Consegue se ver?

A mulher arregalou os olhos e seu rosto pareceu mais agressivo.

 -Isso é fruto da sua cabeça. -Insistiu a mulher. - Você é quem quis assim...
-Não, eu nunca quis isso aqui, eu nem sei o que me espera a frente! Isso aqui é sobre você!
-(GARGALHADA) Desde que mudou não está mentindo muito bem...
-Eu aprendi, e pelo visto você precisa também. Não se vê no espelho porque isso tudo que criou não existe, essa vida, esse jeito, você mentiu tanto, que as pessoas começaram a ver você de diversas formas possíveis, menos a que realmente é. Está sozinha porque todos desistiram das suas mentiras. E no fim, é isso que sempre sobra quando não agimos com verdade!
-É MENTIRA! VOCÊ ESTÁ MENTINDO! É O MAIOR MENTIROSO QUE EU JÁ CONHECI... COMO PODE FALAR SOBRE ISSO!
-Todo mundo mente, e isso não tira a culpa de ninguém. Mas diferente de você eu não vivo em mentira. Eu evoluí!
-Não... Não... Não... As paredes, os móveis e toda a casa começou a derreter revelando um lugar completamente abandonado, sujo e cheio de poeira.
-Caralho, você era boa na mentira, hein...?

Os empregados começaram a aparecer como se estivessem perdidos em um outro mundo, e da mesma maneira que olhavam a casa que estava entregue as moscas eles olhavam para a patroa que estava jogada ao chão chorando.

-Reconstruir pode ser difícil, mas viver sem ter peso é muito mais fácil e melhor... Eu nunca tive medo de construir, eu paguei o preço e refiz. -Eu sorri para o auto e sussurrei baixinho. -Obrigado tio, eu entendi a lição.

Ela se levantou e enxugou as lagrimas.

-Os preços são altos, garoto! Acha que as coisas mudam de um dia para o outro?
-Claro que não, mas. -Eu abri os braços novamente na sala. -Reconhecer já é um começo, não é?
-E o que eu devo fazer agora?

 Ela fez cara de nojo

-Bem, arrumar a bagunça!

Ela estalou os dedos para os empregados.

-Vocês! Arrumem essa casa, deixem ela... Apresentável de novo!

Eu sorri para ela como forma de incentivo e em troca ela balançou a cabeça.

-Venha, quero te dar uma coisa.

Ela abriu o porta joias empoeirado da penteadeira e tirou um pulseira com um pingente.

-Isso é pra você, você mereceu garoto, leve-a e complete todos os espaços até chegar ao fim da trilha.
-Nossa, é lindo!

Eu estendi o braço e ela o prendeu no meu pulso.

-Agora vá, e como falei não olhe para trás, você já superou esse nível.

Eu corri para os fundos da casa e saltei para a trilha, eu me sentia feliz e mais leve, o pingente balançava a cada novo passo que eu dava, e a sensação de dever cumprido me preencheu de tal forma que o caminho pareceu mais curto quando cheguei em uma outra mansão, mais rústica com horta e pomar. Era incrível, como as coisas podiam estar tão próximas e parecer tão diferentes. Eu estava entrando em uma fazenda.

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